Nelson Gonçalves: o mito (2ª parte)

Na semana passada, abordamos sobre a origem da família humilde do menino Antônio Gonçalves Sobral, o Tonico, o Metralha, o cantor Nelson Gonçalves; sobre, principalmente, os percalços do inicio da carreira, até chegar ao sucesso nacional. Hoje, sobre sua careira e os primeiros sucessos.

Aos 20 anos já estava casado com Elvira Molla, com quem teve Marilene e Nelsinho. E, não desiste da música, apesar de tudo ser muito difícil na Sampa. Partiu para o Rio cantar parecido com Orlando Silva nos programas de calouros das rádios cariocas, sendo reprovado em todos os testes. Um deles, comandado por Ary Barroso, que sugeriu ao jovem que “voltasse a ser garçom no bar do Quincas, em São Paulo. Apesar de abalado, aceitou a sugestão”.

Em meados de 1941, “os compositores Orlando Monella e Oswaldo França o convidaram para gravar uma valsa deles: Se Eu Pudesse Um Dia“. Nelson volta, então, ao RJ, levando consigo uma carta de apresentação para o Diretor da RCA Victor, Victor Lattari, que ouviu a gravação. mas, quando o moço falou “cuspindo as palavras“, o executivo explode: “Essa voz do disco não é sua coisíssima nenhuma, seu gaguinho de uma figa, Ladrão de acetato, você roubou essa prova” . O músico Benedito Lacerda, intermediou dizendo “que tem gago que, quando canta, é um fenômeno.” Assim, o jovem precisou soltar a voz ali mesmo, ao vivo, para provar ser o dono da voz “suspeita”.

Foi contratado na hora. Mas, faltava uma música para o lado B do disco; Saiu, portanto, a procura do compositor do Café Nice, Ataulfo Alves, de quem obteve Sinto-me Bem, cujo samba “cairia como uma luva na voz de Nelson”. Pronto estava o “seu primeiro e antológico 78 rpm, gravado no dia 4 de agosto de 1941”. Nesse mesmo dia, grava Formosa Mulher, de Constantino Silva e Oswaldo França e A Mulher dos Sonhos Meus, de Ataulfo Alves e Orlando Monella.

O disco foi um sucesso. Contudo, o cantor não tinha contrato. O que fazer? Precisava se virar. Foi para o Passarela das Mariposas, na Lapa, onde só tinha lugar para 3 tipos de homem: o malandro, o valente e o otário. Segundo o próprio Nelson: “Um cantor desconhecido, naquele meio, só podia ser enquadro no terceiro grupo: o dos otários”. Porém, malandro e, que de otário não tinha nada, foi bem acolhido pelos mais bambambãs do lugar. Mas, seu bolso seguia vazio. Seu pedágio era uma ninharia, apenas 15 mil réis. Seguia sem contrato. Que tal, voltar para a Paulicéia? Pensou ele.

Entre o sonho da música e a realidade da vida, gostava de armar barraco. Por exemplo, no Nice, certa feira, resolveu aplicar um violento jab no estômago do colega Chico Alves, e disse que fora apenas um mal-entendido. “É que Metralha andava na corda bamba, circuncisfláutico demais. Foi então que o amigo e padrinho Carlos Galhardo, o apresentou a Edmar Machado, Diretor da Rádio Mayrink Veiga, que o contratou por 600 mil réis, Não havia o que discutir: tutu no bolso e 12 músicas já gravadas pela RCA Victor.

Eram novos dias. E melhores. Vieram quando um problema no lado A do sei disco, fez ser gravado “às pressas um foz que nem estava programado: Renúncia, de Roberto Martins e Mário Rossi, no dia 27 de maio de 42, foi um estouro na vida desse artista. Em 1942/1943, foram vendidas 35 mil cópias. Um recorde. Era o início de sua ascensão. O barão Stuckart o convidou para ser crooner do Cassino no Copacabana Palace Hotel, com salário de 9 contos por mês. Era a melhor coisa que podia acontecer para um artista”.

Em 1945, outro sucesso: Maria Bethânia, de Capiba. No ano seguinte, o artista vive um romance com a vedete espanhola Nancy Montez, e naquele carnaval, a música Espanhola, de Benedito Lacerda e Haroldo Lobo, na interpretação de Nelson, era a mais cantada pelo povo nas ruas. Entra, inclusive, para o cast da Rádio Nacional; e daí para o lendário Cassino da Urca seria um pulo. “Estava realmente casado com os fãs, os contratos milionários e a popularidade. Aliás, é dele esta declaração: “para ser adorado por uma mulher, convém amá-la pouco, prometer muito e fingir sempre…”

Em 1950, no Baile dos Artistas do Hotel Glória, tinha muito lança-perfume e a mulherada estava “solta”. No carnaval daquele ano, a música Serpentina, de Haroldo Lobo e David Nasser , na voz de Nelson, era o grande hit. Vivia-se uma época animada. Mais um lance amoroso na vida de Nelson: ele se apaixona perdidamente pela cantora Lourdinha Bittencourt (seu Pecado Ambulante). Com ela o malandro aprende a declinar o verbo amar. Sua vida se organiza: “começa a estudar de novo, a situação financeira se equilibra e seus bens são transformados em imóveis. Tinha que pensar no futuro. Desde 52 estava legalmente separado de Elvira num desquite amigável (…). A vida era um mar de rosas”. Nelson ria à toa, para lembrar Vinicius.

O ano de 1952 foi um marco na vida e na carreira do cantor. Nos estúdios da Rádio Nacional, conhece aquele que foi o seu compositor preferido, de quem gravaria 370 composições: Adelino Moreira. “A partir desse encontro, ele entre numa nova fase, ou seja, sai da sombra de Orlando Silva, define seu estilo e marca definitivamente sua personalidade de intérprete. Torna-se o cantor oficial da dor-de-cotovelo e da boemia. Inaugura o brega. No dia 8 de maio daquele mesmo ano, grava o samba-canção Última Seresta, de Adelino Moreira e Sebastião Santana, até hoje um carro-chefe do seu repertório”.

Mais uma vez, esperamos ter acertado no bom gosto dos nossos leitores. Na próxima semana, a 3ª e última parte. Quanto, iniciaremos falando de A Volta do Boêmio, de 1956. Até lá e uma ótima leitura.

Por Angeline e Francisco Gomes e Winnie Barros.

Fonte: 1. Livre encarte da caixa com 3 CDs: Nelson Gonçalves – O rei do Rádio, RCA Victor, 1995.

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