O “Ritual” de Márcia Siqueira

“Garimpando” aqui e ali, a nossa equipe adquiriu os quatro discos (CDs) gravados por Márcia Siqueira. São eles: “Canto de Caminho”, “Encontrar Você”, “Nada a Declarar” e “Ritual”. São trabalhos fonográficos imperdíveis para quem gosta de música. Sobre esse primeiro, já havíamos comentado a sua indiscutível qualidade. Hoje, portanto, vamos de “Ritual”. Mas, antes, cabe bem uma pequena síntese da biografia dessa notável artista.

Ela tem 52 anos de idade e é amazonense de Itacoatiara. Desde criança lida com música. “Com apenas 14 anos, ela passaria a cantar em bares da capital amazonense” (1). No passado já morou em algumas cidades nordestinas. Mas, atualmente reside em Manaus. Seu talento artístico é grandioso e a sua voz é indiscutivelmente uma das mais belas do Brasil.

“Com quatro álbuns no currículo, participação em disco de Maria Bethânia e shows na Alemanha, Márcia teve a vida e a carreira retratadas no livro A VOZ DA FLORESTA, lançado em 2020. Nesse mesmo ano, a cantora se tornou a primeira mulher levantadora de toadas do Boi Bumbá Garantido, dentro do Festival de Parintins” (1). Aliás, diga-se de passagem que essa Márcia vem desempenhando essa tarefa com muita galhardia.

“Ritual” é um disco lindo em todos os aspectos. São 11 músicas que fazem transbordar o nosso interior em contentamento. Por sinal, um CD muito bem produzido, bem gravado, é lógico. Entre as canções estão: Serpente de Rio (Rui Machado e Sidney Rezende), Povo de Alma Vermelha (Paulinho Dú Sagrado), Eterno Amor ( Kleber Paiva) e Índia Lua (Antonio Pereira). Tem mais: as fotos de Ruth Jucá, aqui por nós reproduzidas, dão o tom da pura arte de ritual da música da floresta, no ritmo das toadas de Parintins, principalmente.

Na contracapa do disco consta: “Os mitos contam como as coisas chegaram a ser o que são. Contam como as divindades, os homens, os animais e as plantas se diferenciaram. Os rituais, por sua vez, fazem o caminho inverso dos mitos: eles se dispõem a recriar o mito promovendo uma espécie de retorno a esse tempo imemorável em que divindades, homens, animais e plantas se comunicavam entre si e produziam sua existência por meio dessa interação. Os povos indígenas, em suas mais diferentes etnias, acreditam que esta comunicação/interação deve se dar de maneira mediata e é indispensável para a produção de pessoas da própria sociedade. Afinal, é desse mundo mítico que são extraídas as matérias-primas para a constituição das pessoas e da sociedade. Perder de vista esta relação é entregar-se à inércia, à permanência num mundo sem sentido” (2).

Índia Lua (terceira faixa) é o ponto alto desse trabalho. No nosso entender, é claro. Pois, além de uma interpretação ímpar, a composição é por demais bela. E, para completar a canção-arte, a criança Cecy Siqueira recita um poema de Alcides Werk (1934-2003), antes de Márcia iniciar a cantar. Esse conjunto – poesia vs música – faz a canção ter uma sonoridade impecável, magistral.

A seguir, primeiramente, apresentamos o poema na sua íntegra. Depois, a composição. Assim: “O sol é o rei dos espaços/Sob a linha do Equador/Mais nunca tem em seus braços/A deusa do seu amor/A lua, essa noiva triste/Sonha um dia em se casar/Mas a natureza insiste/O sol amado levar/Para o equilíbrio do céu/O sacrifício do amor/E a noite em escuro véu // A lua esconde a sua dor/Somente a boca da noite/E no momento da alvorada/Os dois amados se veem // O rei sol e a lua amada/De tanto chorar a lua/No seu mundo escuro e frio/Suas lágrimas de luz/Vão formando grande rio” – poema (3).

“Contam que tua gente se perdeu/No clarão do dia/Em que uma nuvem escureceu/E então tua sina índia minha/Vem na mão de Deus/Tua sina vem na mão de Deus // Muito acima dos verdes lençóis/Destas matas/Teus olhos vigiam sem cessar/E essas matas/Guardam teus segredos índia minha irmã/Guardam teus segredos minha irmã // Teu pranto é lunar, teu olhar lunar/Teu pranto é lunar, teu olhar lunar/Teu pranto é lunar, teu olhar lunar/Teu pranto é lunar, teu olhar lunar” – composição (3).

Que combinação maravilhosa, gente! Amigo (a) leitor (a), independente de ser fã ou não da talentosa cantora Márcia Siqueira, ouça suas canções (que estão disponíveis nas plataformas digitais). É muito prazeroso. Acalma o corpo e rejuvenesce a alma. Como bem o lembra a citada artista: “Não morre aquele que deixou na Terra a melodia de seu cântico na música de seus versos” (2).

Notinha útil – Lá longe, em Vilhena (RO), fronteira com o Mato Grosso, o jovem casal Tereza e Maycon, nos avisou que comemorou os oito meses de nascido do seu primogênito João Miguel no último dia oito deste mês. Tanto ao aniversariante como aos seus pais e demais familiares, nós, do Facetas, desejamos muita saúde e vida longa.

Por Angeline e Francisco Gomes e Winnie Barros.

Fontes consultadas: 1. Márcia Siqueira – Amazonas, Carlos Andrade, 2021 (www.12.senado.leg.br); 2. CD “Ritual”, de Márcia Siqueira, ZFM/Manaus, 2019; e 3. http://www.letras.mus.br.

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