Sempre nos deparamos com a difícil tarefa na escolha de apenas uma composição (cação-poema), ou seja, uma letra cantada para representar o artigo do mês. Mesmo assim, eis aqui uma das mais belas músicas do cancioneiro brasileiro: uma prece, sem dúvida.

Vamos lá. Nos nos 80, nós, os estudantes do 2º grau (atual ensino médio), da cidade de Lábrea (AM), costumávamos realizar as chamadas Gincanas Culturais, ou Recreios Cantantes, como preferiam alguns mestres. Por exemplo, em 1983, resolvemos fazer uma homenagem às mães pela passagem do dia delas. As atividades foram realizadas em dois dias: sábado e domingo. E, as equipes foram divididas em duas modalidades: a desportiva com corridas, cabo-de-guerra, futebol de quadra, etc, e a cultural com interpretação de música, grupo de teatro, recital de poesias e leitura de contos, etc. No domingo à noite foi feita a premiação dos vencedores, em todas as modalidades.
Naquela noite, o “auditório” do Ginásio Santo Agostinho estava lotado pelas torcidas, convidados – principalmente mães -, jurados, professores, candidatos à declamação de poesias e intérpretes de músicas, banda de músicos e a comunidade local. Logo, o apresentador anunciou que o show de calouros iria iniciar. Foram várias as apresentações. Por fim, o jurado anunciou os três cantores ( 3º, 2º e 1º) finalistas. Estamos, portanto, nos reportando apenas sobre as músicas. Foi um fim de semana apoteótico. Momentos que marcam a vida da pessoa, do estudante.
Interpretando Utopia (1976), de Padre Zezinho e ocupando a terceira posição, ficou Cida Feitosa, que cantou estes verso: “Meus pais não tinham nem escola e nem dinheiro/todo dia o ano inteiro trabalhavam sem parar/faltava tudo, mas gente nem ligava/o importante não faltava/seu sorriso e seu olhar…”; em segundo lugar, com Oração de Um Jovem Triste, conhecida em todo o Brasil na voz de Antonio Marcos (1971), ficou o talentoso Antonio Carlos Lacerda de Souza, que emocionou o público presente com estes versos: “Se, se jamais acreditei/Perdoa-me, Senhor/Pois hoje eu Te encontrei…”; e em primeiríssimo lugar, Wainer Celestino que cantou Indiferença (1982/83), ora sucesso nacional no rádio e na televisão, de Jerry Adriani, quando a plateia cantou com ele, estes (e outros) versos: “Lembro quando nós nos conhecemos/Havia mais desejo em seu olhar/Aquele nosso beijo apaixonado/Uma vontade louca de se amar… // Não deixe tudo se acabar assim/Eu sei que ainda existe amor…”.
Quando o jovem Lacerda – como era bastante conhecido entre professores e estudantes – cantou, ajoelhado, estes palavras, foi algo emocionante. Muitos choraram, inclusive mães: “Ergo os braços para o altar/E a luz do teu amor/Me torna tão feliz”. Porém, os jurados (na sua maioria) preferiram atribuir o primeiro lugar à canção Indiferença, como já foi dito. Acredita-se que tenha o estrondoso sucesso romântico daquela música naquele ano. Mas, não houve problema algum. Tudo era muita familiar; cultura local. O mais importante foi a realização do evento e a quem se destina a homenagem. Aliás, foi uma das mais organizadas Gincanas das várias que participei. Foram dois dias de festa popular na movimentada Praça Coronel Labre (assim mesmo: Labre. A palavra Lábrea é um derivado do nome do fundador da cidade: o maranhense Antonio Rodrigues Pereira Labre).
Vamos então, à íntegra do poema-canção Oração de Um Jovem Triste. Mas, antes um pequeno comentário sobre o autor. Alberto Luiz (Alberto Luiz Farah,1948-2009), foi um cantor, compositor e pianista carioca. Criador de 169 fonogramas, entre eles, sucessos como a música ora em questão, Balada nº 7 (Mané Garrincha), grande hits na voz de Moacyr Franco, A Última Carta, Conversa de Jardim, entre outras. A letra a seguir é original. Foi, inclusive gravada pelo autor em 1968. Há muitas postagens na Internet com erros gravíssimos que mudam completamente o sentido da composição.
“Tanto eu ouvia falar em Ti/Por isso hoje estou aqui/Eu tive sempre tudo o que quis/Porém, confesso não sou feliz // Calça apertada de cinturão/Toco guitarra faço canção/E quando tento me procurar/Eu não consigo me encontrar // Cubro o rosto com as mãos/E uma tristeza imensa/ Me invade o coração/Já, já não sou capaz de amar/E a felicidade cansei de procurar // Ah! Ah!… // Por isto venho buscar em Ti/O que não tenho, o que perdi/Vestido em ouro Te imaginei/E tão humilde Te encontrei /Cabelos longos iguais aos meus/Tu és o Cristo, Filho de Deus/Tanta ternura em teu olhar/Tua presença me faz chorar //Ergo os braços para o altar/E a luz do teu amor/Me torna tão feliz/Se, se jamais acreditei/Perdoa-me, Senhor/Pois hoje eu Te encontrei…”.
Aos nossos leitores, oferecemos esta oração, e esperamos, mais uma vez, que gostem desta nossa iniciativa.
Por Angeline, Francisco e Winnie.
Fontes: 1. www.letras.mus.br; 2. CD “O essencial de Antônio Marcos”, SP: Focus/BMG/RCA, 1999.