Ana Cristina Cesar: 40 anos depois

“Subi as escadas da noite./Desci as escadas do dia”.

A poesia realmente supera o tempo. Eis aqui um exemplo, da poetisa, professor e tradutora carioca Ana Cristina Cruz Cesar, nascida na cidade do Rio de Janeiro no dia 2 de junho de 1952, onde morreu no dia 29 de outubro de 1983, aos 31 anos de idade. Breve na vida, mas vasta na poesia. “Deixou um rastro duradouro na literatura brasileira. Foi aluna meticulosa e poeta indócil. Conheceu por menores de cânone e os rigores do fazer poético, mas também desprezou o academicismo barato” (1).

“Foi contemporânea da geração de poetas independentes que nos anos 70 rodavam versos em mimeógrafos para chegar ao público. Sua trajetória literária foi impressionantemente precoce – começou aos 7 anos de idade, quando as primeiras poesias foram publicadas no suplemento literário do jornal Tribuna da Imprensa, no Rio de Janeiro. Terminado o ginásio, passou um ano em Londres e viajou depois por diversos países” (2). aos 19 anos, em 1971, ingressou no curso de letras da PUC-RJ. Professora de português e inglês. Época em que traduziu e publicou ensaios e resenhas em vários jornais e revistas brasileiras.

“Em 1976, alguns de seus textos e poemas foram incluídos na antologia 26 Poetas Hoje, compilada pela professora Heloísa Buarque de Hollanda (Heloísa Teixeira, atualmente)” (2). O seu 1º livro foi Cenas de Abril (poemas). O 2º, Correspondência Completa (prosa), ambos independentes, publicados em 1979. Em 1980, na segunda viagem à Inglaterra, editou o Luvas de Pelica e, em 1982, lançou o último trabalho, A Teus Pés (2).

Em 1991, Editora Brasiliense publicou a 2ª edição de Inéditos e Dispersos, onde consta os dois poemas seguintes: A TERCEIRA NOITE, cujos versos são estes: “Era uma terceira noite./O giroscópio girava girando./Minha gravata balouçava no ar./Meus guizos tocavam tocando. // Subi as escadas da noite./Desci as escadas do dia./Fui descendo para cima,/E subindo para baixo! // Mas num dado momento,/Eis que sibila o vento/As escadas se corrompem/O quarto dia despenca/E a nova noite aqui fica”; e POEMA ÓBVIO, assim: “Não sou idêntica a mim mesma/sou e não sou ao mesmo tempo, no mesmo lugar/e sob o mesmo ponto de vista/Não sou divina, não tenho causa/não tenho razão de ser nem finalidade própria:/Sou a própria lógica circulante” (2).

Na 8ª edição, de 1992, de A Teus Pés, da mesma Editora, consta SAMBA-CANÇAO: “Tantos poemas que perdi./Tantos que ouvi, de graça,/pelo telefone – taí,/eu fiz tudo pra você gostar,/fui mulher vulgar,/meia-bruxa, meia-fera, risinho modernista/arranhado na garganta,/malandra, bicha/bem viada, vândala,/talvez maquiavélica,/e um dia emburrei-me,/vali-me de mesuras/(era uma estratégia),/fiz comércio, avara/embora um pouco burra,/porque inteligente me punha/logo rubra, ou ao contrári cara pálida que desconhece/o próprio cor-de-rosa,/tantas fiz, talvez/querendo a glória,/a outra cena à luz de spots,/talvez apenas teu carinho,/mas tantas, tantas fiz…” (2).

Passados 40 anos da partida de Ana Cristina, sua memória está preservada e a sua poesia (sempre) declamada por todos aqueles que admiram seus versos, suas palavras, sejam em forma de rimas ou não, como estes: “Pergunto se sou louca/Quem saberá dizer/Pergunto mais, se sou sã/E ainda mais, se sou eu/Que usou o viés para amar” (2). Amigo (a) leitor (a), usa você também um viés da vida para amar. Amar muito enquanto há tempo.

Por Angeline e Francisco Gomes e Winnie Barros.

Fontes: 1. Revista Cult, ed. 298, outubro de 2023; 2. Revista Caras, ed. 21, 1º.04.1994.

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