“Ary Barroso de Ubá/Ary da gaita/Ary flamengo/Ary do Rancho Fundo/Ary aquarela/Ary do Brasil”*
Em 2016, quando estouro nas mídias, a música Chegaste – originalmente da cantora porto-riquenha Kany García -, nas vozes de Roberto Carlos e Jeniffer Lopez, um jornalista disse: “O ‘rei’ tem uma capacidade musical incrível em transformar velhas canções em novos hits”. No entanto, são muitos os artistas brasileiros dotados dessa façanha. Aqui, citamos a seguir apenas um exemplo entre muitos clássicos da MPB.

Em 1980, ou seja, há 44 anos, quando Gal Costa (1945-1922) lançou “Aquarela do Brasil” de Ary Barroso (1903-1964), contendo 10 músicas dele e 2 de parcerias, como: Camisa Amarela, Faceira, Aquarela do Brasil, É Luxo Só, Já Era Tempo, entre outras, esse acontecimento fonográfico causou alvoroço nos meios de comunicação por, pelo menos, dois motivos: o resgate de composições de décadas passadas; e o imediato sucesso de várias músicas desse LP que caíram no gosto dos ouvintes.
Na contracapa do citado disco, o produtor musical carioca Guilherme Araújo (1936-2007), publica esta nota: “Ary Barroso dominou a música popular brasileira durante as décadas de 30, 40, 50 e do início da de 60. Sua personalidade avassaladora está presente na “chamada” fase de ouro (1928-1946) de nossa música popular. Em 1929 editou as suas primeiras composições e até 1964, ano de sua morte, é presença marcante na vida brasileira. O sucesso no exterior de Aquarela do Brasil, em 1944, levaria Ary a fazer diversas viagens nos Estados Unidos, sendo uma delas para receber o diploma da Academia de Ciências e Artes Cinematográficas de Hollywood. Seu prestígio no Brasil não decorria apenas do grande compositor e poeta que era. Foi pianista, radialista, dos mais populares, regente, locutor esportivo.
Mas Ary Barroso compositor, um dos maiores do Brasil que recebe a homenagem de Gal Costa numa seleção representativa do que deixou e fez da nossa música popular uma das coisas mais bonitas desse país. Sozinho e com outros parceiros musicais o LP Aquarela do Brasil, de Gal Costa, é um registro da força e da atualidade de Ary Barroso. E foi com grande felicidade que acompanhei o carinho e a dedicação de Gal desde os primeiros contatos com as velhas gravações que ouvíamos até a seleção final do repertório. Ela aqui está inteira, dando a sua alma e o seu talento para as gerações mais recentes recebem como lançamento essas 12 composições de Ary Barroso” (1).
Ontem, a nossa equipe ouviu o vinil em questão por inteiro – num aparelho bem familiar dos anos 90 -, e mesmo assim a qualidade do som se sobrepõe a quaisquer outros sistemas digitais (sem demérito ao CD ou DVD). Trata-se de um disco excelente. A sonoridade é magnífica como por exemplo estes verso: “Olha, essa mulata quando dança/É luxo só/Quando todo seu corpo se embalança/È luxo só/Porém seu coração quando se agita/E palpita mais ligeiro/Nunca vi compasso tão brasileiro” (in É Luxo Só, de 1957), ou ainda in Na Tabuleiro da Baiana, de 1937, onde Gal faz dueto com Caetano Veloso: “Juro por Deus/Pelo Senhor do Bonfim/Quero você baianinha inteirinha pra mim/E depois o que será de nós dois/Seu amor é tão fugaz, enganador”.
E, no ponto mais alto da escala de composição ariana vem Aquarela do Brasil (1939), cuja 4ª e última parte é assim: “Ah que essas fontes murmurantes/Aonde eu mato a minha sede/E onde a lua vem brincar/Ah esse Brasil lindo e trigueiro/É o Brasil brasileiro/Terra de samba e de pandeiro/Brasil, pra mim, pra mim, Brasil/ Brasil, pra mim, pra mim, Brasil/Brasil, pra mim, pra mim”. Genialíssimo !
Consta na vasta biografia do mineiro Ary Barroso (nascido na cidade de Ubá, onde também nasceu o grande cantor romântico Nelson Ned), esta faceta: na década de 40, quando Walt Disney, de passagem pelo Estado do Pará, quis ouvir uma música típica do Brasil, a pequena orquestra e meio desafinada tocou Aquarela do Brasil. Ele gostou tanto que “ao chegar ao Rio, pediu para ser apresentado ao compositor da música. Após conhecer Ary, o norte-americano não teve dúvidas: usou a composição como fundo musical das aventuras do então estreante papagaio Zé Carioca, no filme Alô, amigos. Entusiasmado com as criações do brasileiro, mais tarde usaria No tabuleiro da baiana e Os quindins de Iaiá no desenho Os três cavaleiros, em que Zé Carioca, Pato Donald e o Galo Panchito contracenavam com Aurora Miranda (cantora e irmã de Carmen Miranda)” (2).
Parafraseando o mestre Ary, o Facetas avisa aos seus leitores, que no tabuleiro da baiana Gal tem muita música de qualidade; tem beleza, afinação, emoção; a arte de cantar com a alma, amor, coração. É só curti-la. Principalmente ouvindo-a: “no amor quem governa é o coração”.
Notinha útil – No último dia 5 deste mês foi celebrado em diferentes partes do mundo o Dia Mundial do Meio Ambiente. Eis aqui, duas citações para a nossa reflexão: 1. “Chegara o dia em que os homens conhecerão a alma dos animais, e nesse dia, um crime contra um animal, será um crime contra a humanidade”, Leonardo da Vinci (1452-1519), pensador italiano; 2. “É preciso estabelecer um pacto de paz com a floresta. Homem e natureza precisam voltar a conviver e a contar, um para o outro, os seus segredos. É preciso pesquisar mais, estudar e conhecer a natureza e os processos sociais”. Dos editores de Ciência Hoje/1997, da SBPC. (www.facetasculturias.com.br).
Por Angeline e Francisco Gomes e Winnie Barros.
Fontes consultadas: 1. LP “Aquarela do Brasil”, de Gal Costa. SP: gravadora Philips, 1980; 2. Coleção (40 CDs + Revista) MPB Compositores, volume 5 – Ary Barroso, SP: editora Globo, 1996.
*Goulart de Andrade, Jornalista