Recife: Museu do homem do Nordeste

Ainda no último mês de julho, quando de curta estada da equipe do Facetas na capital pernambucana, fizemos uma detida visita ao Muhne, situado na Avenida Dezessete de Agosto, bairro Casa Forte, zona Norte, onde fizemos fotos, leituras de textos históricos lá expostos, anotações, etc, sobre o que víamos. Entre tudo, o que mais chamou a nossa atenção, a começar por esta citação, logo na entrada: “Em museus de Antropologia, os objetos admitidos como invólucros da vida de homens reais” .

“Fundado em 1979 o Museu do Homem do Nordeste (Muhne), vinculado à Fundação Joaquim Nabuco/Ministério da Educação, reúne desde sua concepção, idealizada pelo sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, até os mais atuais, narrativas do encontro dos povos fundadores da sociedade brasileira. Comprometido com uma museologia dos sujeitos, o Muhne busca compreender como, ao longo da História, a fortuna de alguns e as desventuras de muitos, suas criações, ilusões e desilusões, deixaram suas marcas no que somos hoje, como brasileiros no/do Nordeste” (1).

Com uma coleção de 16 mil peças advindas das culturas indígena, europeia e africana, esse museu “tem a missão de pesquisar, documentar, preservar, difundir e atualizar o rico patrimônio cultural, material e imaterial do Nordeste do Brasil. O Muhne nasceu da junção de três extintos Museus: o de Antropologia, o de Arte Popular e o do Açúcar, o que possibilitou reunir um acervo representativo da formação histórica, étnica e social da Região” (2).

A soma dos bens ali existentes, faz a instituição ser “um dos mais importantes Museus histórico- antropológicos do Brasil. Acervo esse que inclui materiais de construção utilizados nos séculos XVIII e XIX até os presentes nos mocambos do século XX, vaqueiros e vaquejadas, dos ex votos católicos às peças de cultos afro-negros: das bonecas de pano e brinquedos populares à cerâmica regional de Vitalino, Nhô Caboclo, Zé Rodrigues, Porfírio Faustino e de outros notáveis e anônimos artistas; das tecnologias do trabalho no fabrico do açúcar a instrumentos que registram as desigualdades de vida em casas grandes e senzalas” (2), cujas marcam profundas existem até hoje, pais afora.

Os bens “revelam a pluralidade das culturas negra, indígena e branca desde nossas origens até os diferentes desdobramentos e misturas que formam o que hoje é chamado genericamente de cultura brasileira” (2). Entre os diferentes “setores” por nós visitados, dois deles, principalmente, chamaram a nossa atenção: “A Pesqueira em Pernambuco” e “A escravidão e os quilombos hoje”. Sobre os quais passamos a comentar.

Para o 1º TEMA, há um amplo espaço para uma jangada em tamanho natural, além de fotos afins e relatos escritos a respeito de pesca, pescador, homem-caranguejo (estudo feito pelo médico pernambucano Josué de Castro, nos anos 40), etc, à disposição do público, é claro. Num dos textos, por exemplo, consta: “Esse modo de vida e cultura se expandem para muito além das atividades que ocorrem no âmbito estrito do trabalho no mar. Desenvolvidas  por meio de uma gama de relações sociais e de conhecimentos construídos, acumulados e transmitidos ao longo de gerações”.

Se no passado, durante muitos anos, a prática marítima pesqueira e sua história no Estado de Pernambuco, foram negligenciadas, hoje, há toda uma formalidade/regulamentação para sua prática, seja para homem ou para mulher, por parte “do Estado, da nacionalização da pesca e assalariamento dos pescadores”. Só para lembrar: a mulher que já foi considerada pela MPB como aquela que fica na beira da praia quando o marido sai para pescar em alto-mar nos idos tempos, na atualidade, “o trabalho feminino nesse setor é realizado, em sua grande maioria, em águas rasas, mais próximas das residência (…). Além da limpeza e venda do pescado e cuidado da família ao ensinar os filhos os conhecimentos dessa atividade”.

Para o 2º TEMA, a escravidão no Brasil, mas especificamente em Pernambuco, ao ver os instrumentos utilizados pelos torturadores contra o escravo “rebelde”, fazem a gente sofrer também, ao relembrar um pouco o que se sabe sobre as atrocidades praticadas. Só para exemplificar, lá estar uma enorme prancha com buracos circunferenciais para prender os punhos “do negro indomado”. Na parede ao lado, estão as frases de Oswald de Andrade e Castro Alves, respectivamente, com estas palavras: “A contribuição milionária de todos os erros”; e “Dança a lúgubre corte ao som do açoite”. Na mesma sala, bem na frente das citações, uma grande foto da “preta velha”, que fingia na sofrer física e psicologicamente para “cuidar do filho do seu senhor”.

O notável jurista, historiador, escritor e abolicionista recifense Joaquim Nabuco (1849-1910), na sua obra-prima “Minha Formação”, de 1884, já dizia: “Senhores, a propriedade não tem somente direitos, tem também deveres, e o estado de pobreza entre nós, a indiferença com que todos olham para a condição do povo não faz honra à propriedade; como não faz honra aos poderes do Estado. Eu (…) não separei mais as duas questões – a da emancipação dos escravos e a democratização do solo. Uma é o complemento da outra. Acabar com a escravidão não nos basta; é preciso destruir a obra da escravidão”. Trecho de mais um texto afixado no Muhne.

Pensa igual a Nabuco, a pesquisadora da Fundaj, Rita de Cássia Barbosa Araujo, quando faz essa observação: “Marca de ferro quente nos pés”; “cicatrizes de chicotadas nas costas”; “queimaduras no estômago e no peito”. Nos jornais do século XIX, eram comuns os anúncios de fuga de escravizados em que os fugitivos poderiam ser identificados por sinais de maus-tratos no corpo”. (idem).

E por fim, consta nas nossas anotações – ainda nas dependência do citado Museu -, esta reflexão de 1936, do mestre maior Gilberto Freyre: “A reeuropeização do Brasil começou fazendo empalidecer em nossa vida o elemento asiático; o africano e o índio, cujo vistoso de cor se tornara evidente na paisagem, no traje e nos usos dos homens. (…), o preto, e o cinzento dos fogões de ferro, das cartolas, das rotinas, das carruagens do século XIX europeu; (…). Isso diz um pouquinho dessa tragédia.

De tudo que vimos e registramos (10 notas; 100 fotos, etc), eis aqui o mínimo de tantos fatos históricos e culturais, aos nossos leitores. Esperamos que todos gostem da nossa iniciativa.

Por Angeline e Francisco Gomes e Winnie Barros.

Fontes consultadas : 1. Fotos, textos e observação de objetos do Muhhe; 2. http://www.gov.br

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