O próprio cantor reconhece: “O meu problema é que eu gosto de outros tipos de música, gosto do trabalhar com Gil, com Hermeto Pachoal, e não poderia ser o Rei do Baião. Isso me limitaria a ser o outro Gonzagão, homem dono de uma incrível personalidade musical e pessoal”. Gil concorda e os define assim: “Luiz Gonzaga é solar, impulsivo, esfogueado, enquanto Dominguinhos é uma figura calma. Gonzagao serio hot e Dominguinhos o cool”.
No entanto, tudo isso (essa fase pela qual passava a música brasileira), não foi o suficiente para evitar uma crise no setor. O domínio da televisão era pesado. Esse meio era tido como o criador de hits. O lema velado era: ‘O que não estava na TV poderia cair no esquecimento’. “Poucos artistas escaparam desse fenômeno”. Dominguinhos entrou na lista das vítimas do estreitamento do mercado. Dominguinhos lança ótimos discos, mas as vendas caem, apesar de manter sua originalidade e ter o seu público cativo.
“Dominguinhos poderia ter construido sua carreira como artista eminentemente regional. Porém, a diversidade e a criatividade do sanfoneiro foram tão grande que a transformação em cantor e compositor de temática universal foi inevitável.” Isso quer dizer que com ele surgiu um novo ciclo para os sanfoneiros, ou seja, estava superada a barreira que separava a música regional (mas, especificamente do Nordeste) do núcleo da MPB (da dos centros urbanos do Centro-Sul do país).
Nessa empreitada, a mais importante parceria foi a de Gil, o qual além de representar o sanfoneiro ao grande público, com Dominguinhos, compôs duas belas canções: Abri a Porta e Lamento Sertanejo. Por bem lembrar, a segunda foi gravada por Maria Bethânia no CD Imitação da Vida, de 1997 e Gostoso Demais, para a trilha sonora do filmo Aventuras de Um Paraíba.
A partir dai, as influências se multiplicaram e as co-autorias diversificaram. Com Nando Cordel, fez Aqui T´a Bom Demais; De Volta Para o Aconchego; e Gostoso Demais; com o carioca Manduka, fez Quem Me Levará Sou Eu, etc. Dessa forma, foram somando-se os parceiros como Chico Buarque, com quem fez Tantas Palavras; com Guadalupe, fez Diz Amiga; com Airton de Oliveira, fez Canto Nordestino; com Clésio (da dupla Clodó e Clésio), fez Querubim; com Abel Silva, fez Quando Chegar o Ver~ao, além de outros nomes com Fausto Nilo, Climério, etc.
Os intérpretes também são muitos. Além dos já citados, eis aqui outros como Anastácia, que gravou inúmeras canções de Dominguinhos; a cantora Guadalupe, com quem fez Esse Mato, Essa Terra; o grupo A Cor do Som, com Abri a Porta. Porém, a boa notícia o legado de Dominguinhos e Luiz Gonzaga, continua bem representado. Cito aqui dois jovens sanfoneiros que estão indo muito bem. São eles: o pernambucano Cezar Thomaz Silveira, o Cezzinha do Acordeon, ou simplesmente, Cezzinha, de 28 anos de idade e o sergipano Erivaldo Oliveira, o Mestrinho, de 24 anos de idade.
Como os intérpretes da arte de Dominguinhos, as cantoras são show. A Elba Ramalho, é um caso à parte. É simplesmente divina. No entanto, as duas artistas que realmente o impulsionaram rumo ao sucesso, foram a cantora Lucinete Ferreira, ou melhor, a Anastácia (que no dia 30 de maio próximo completará 76 anos de idade e 61 anos de carreira). A parceria entre os dois, ambos nascidos em 1941, perdurou por cerca de 12 anos. “Em 1966, tiveram o primeiro encontro profissional. No ano seguinte, depois de excursão com Luiz Gonzaga, a parceria musical e o romance foram inevitáveis. Juntos compuseram diversos sucessos, como Tenho Sede e o clássico Eu Só Quero Um Xodó. Dessa maneira, surgiu uma talentosa dupla de artistas nordestinas. A sanfona encontrou na voz e nas letras de Anastácia terreno fértil para dar vazão a seguimentos sertanejos”.
A outra cantora foi Gal Costa. Em 1970, quando do show Índia, cuja expectiva pelo público e pela crítica era grande, a baiana sobe no palco acompanhada de um rapaz vestido com roupas de couro nordestinas e segurando uma sanfona. “O povo ria quando eu entrava no palco da Gal”, Lembrava Dominguinhos anos depois. E concluindo diz: “Pensavam que eu ia estragar o show todo, atrapalhar a Gal. Chegavam até a vaiar. Mas, no final, viam que a sanfona pode tocar tudo, e ser bonita sempre. Muito garoto aprendeu a respeitar a sanfona a partir dali e esse ´e o meio maior orgulho”.
Senhor de uma discografia invejável! Entre 1964 e 2010, foram lançados mais de 40 LPs, alguns CDs, e um ou dois DVDs. S´o para exemplificar: em 2007, gravou o CD Canteiro, com participação especial de Margareth Darezzo; em 2009 grava o DVD ao vivo em Nova Jerusalém, com participação de Yamandu Costa, e por aí vai. Seu último trabalho foi o CD Iluminado, em 2010.
Porém, como ninguém se sobrepõe ao tempo, no dia 23 de julho de 2013, morre José Domingos de Moraes, aos 72 anos de idade, vitima de câncer pulmonar. Se vivo estivesse, ontem teria completado 76 anos. No entanto, o artista persistirá no tempo, e sua obra entrará para a posteridade. Assim como durará por muito tempo a sua última sanfona, que deve estar preservada em um canto qualquer (pelo menos, espero que sim). Dominguinhos se foi. Ele foi abrir a porta do aconchego perpetuuum, lá onde a lei seja o silêncio .
Quanto aos seus seguidores, que admiram e respeitam a ARTE de Dominguinhos, só resta manter sua obra cada vez mais viva. Toda homenagem será bem vinda, mesmo que póstuma, para o bem de todos e felicidade geral da cultura nacional. Lá em Recife, PE, por exemplo, mas precisamente na Rua General Polidoro, no bairro da Várzea, próximo a UFPE, Zona Oeste, no Restaurante Arriégua, sanfoneiros de todos os lugares, de todas as idades se reúnem no dia 23 de julho para tocarem as suas musicas e reviverem a saudade dele. Luis Ceará, dono do restaurante diz:
“Nós temos saudade. Mas, mais que saudade, temos orgulho. Orgulho de ele ter deixado esse legado, que faz tantos jovens e crianças se inspirarem nele”.
” Ele vivia viajando , mas, quando chegava, sempre vinha aqui para comer aquela comidinha diferente”.
Lá no Arriégua, o senhor Luiz, mantém, a caráter, uma mesa e sobre ela, uma sanfona. Você já sabe o porquê. Por isso mesmo. Pois sempre que podia ia até lá saborear uma galinha caipira com xerém, sem sal. Parabéns ao proprietário por essa iniciativa, juntamente com todos os músicos que até vão, assim como os demais frequentadores.
Apesar de Lamento Sertanejo ser uma das mais grandiosas canções que já ouvi, peço licença ao meu leitor para exibir aqui a letra de Gostoso Demais, que apesar de versos simples, sua melodia é indiscutivelmente bela.
GOSTOSO DEMAIS
Tô com saudade de tu, meu desejo
Tô com saudade do beijo e do bel
Do teu olhar carinhoso
Do teu abraço gostoso
De passear o teu céu
É tão difícil ficar sem você
O teu amor é gostoso demais
Teu cheiro me dar prazer
Quando estou com você
Estou nos braços da paz
Pensamento viaja
E via buscar meu bem-querer
Não dá pra ser feliz, assim
Tem dó de mim
O que eu posso fazer.
Fonte:
1. www. musixmatch.com
2. wikipedia.org
3. G1.globo.com
4. http://www.apontador.com.br
5. Dominguinhos, Col. MPB Compositores, encarte 34, ed. Globo/RGE Discos, SP, p.1997.
6. CD Col. MPB Compositores, vol. 34